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quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

MAIS UMA DO FILÓSOFO.

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Enquanto não retorno das férias vou atualizando meu Blogue com textos do Filósofo PAULO GHIRALDELLI JR. Além de ser uma leitura agradável e perspicaz ele aborda temas relacionados a assuntos de interesses variados.
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Este texto fala sobre ideologia. Do meu ponto de vista entendo que qualquer pessoa que escreve textos deve saber claramente a que se destina suas ideias. É burrice escrever alguma coisa e depois dizer que é um texto neutro. Não existe neutralidade quando se trata de ser humano.
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As ideias utilizadas na elaboração do texto estão impreganadas de tendências. É a sua ideologia. Quer saiba ou não o escritor. Quer queira ou não. A que se destina o texto escrito? A nada? Por nada? Qualé!
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A seguir o artigo do Filósofo:
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“QUERO SER ESCRITOR POLÍTICO, O QUE FAÇO?”
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19/01/2009.
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"Isenção” para a extrema direita que circunda a revista Veja funciona assim: ou você chama qualquer pessoa que tem algum propósito de “olhar pelo social” de comunista ou você é “parcial”. O problema desse tipo de atitude é que o comunismo é recriado, ou melhor, é criado a partir do nada.
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Ninguém é comunista, salvo meia dúzia de pessoas que pararam no tempo antes mesmo do fim da URSS. Mas, ninguém hoje em dia deixa de ter um “olhar pelo social”. Até mesmo os que defendem um liberalismo pré-século XIX, acabam tendo de se preocupar com distribuição de renda, papel do estado na economia para além do que postulava um liberal clássico, ampliação (ou não) de sistemas criados com o Welfare State etc. E como todos têm algum “olhar pelo social”, então todos se tornam “perigosos” para uma parte dos extremistas que rodeiam a Veja.
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O mais engraçado é que como em termos positivos não há muito quem apoiar com o perfil que os radicais de direita desejam, eles terminam por enaltecer figuras de centro. E então, ao se dependurarem nelas, passam a imagem de que elas seriam bem mais duras do que são. Isso é tão verdade que um político que já foi da área de educação, contou outro dia em uma roda de amigos: eu tenho medo de ser elogiado na Veja. O político inteligente é aquele que recusa de ter o apoio da Veja. Pois, uma vez na Veja ele pode cair nas graças de um Reinaldo de Azevedo ou de um Mainardi, e então deslizar para os braços também de algum desequilibrado mais à direita ainda. E uma vez citado benevolamente por esse tipo de gente, o risco de não ser levado mais a sério é grande.
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A revista Veja, agora, se tornou uma faca de dois gumes. Alguém da Veja telefona para você, querendo uma entrevista (como já ocorreu comigo!), e eis dá aquela sensação ruim de que não há o que dizer: abro minha boca ou não? Como filósofo não preciso abrir minha boca para uma revista – posso decidir isso. Mas, e se a pessoa é um político, que vive do voto, que vive de conversar e gastar saliva? Vai se negar a conversar? O problema é que, se falar coisas à esquerda, não sai, e se falar coisas bem à direita, é elogiado, e se falar coisas analíticas, tentando ir a fundo do tema, não é entendido. Ora, esse crivo mata qualquer político, pois o eleitorado de direita, no perfil do leitor da Veja, é o tipo de gente que age não como Mainardi ou Azevedo, mas de modo parecido com os desiquilibrados que os circundam. Ora, Mainardi e Azevedo não se preocupam com isso, pois sabem que não é eles que têm leitores, mas o meio de comunicação que eles têm nas mãos que os fazem serem lidos. E eles sabem bem que são limitados em termos culturais. Mas há os que circundam em torno deles que são doidos. Então, falar à Veja – assim pensa o político que não é bobo – pode ser um meio caminho para colocar o pé na lama e se afundar, ganhar uma coloração envelhecida de viúva da TFP, caso um doido desses invente de falar bem de você.
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É claro que o inverso também é verdade. Ninguém que tem algum juízo quer ser colocado ao lado de um esquerdista que defende o regime de Fidel Castro. Aliás, Niemeyer diz coisa boa de Fidel e é ouvido por conta da idade – as pessoas de bom senso que escutam dão desconto. Todavia, a esquerda fora-de-propósito tem lá seus protetores, pois, por conta de certa condescendência dos democratas, acaba sobrevivendo. Por exemplo, Frei Beto escreve elogiando Fidel, que foi visivelmente um assassino, e vários democratas acabam tolerando isso, pois, afinal, ainda vivemos com um corporativismo de esquerda que é esquisito. E talvez seja isso que faz com que muita gente tenha medo de escrever coisa que eu não tenho medo de escrever. Por exemplo, não tenho nenhum medo de escrever que Saramago é um estalinista, que é uma figura deprimente que não ajuda nem um pouco o pensamento de esquerda. Mas muitos temem dizer isso, embora pensem assim.
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Assim, no caso da esquerda, não são os políticos que temem uma aproximação com extremistas, são os intelectuais democratas sérios que, não raro, se acovardam. Ou seja, não há uma revista de esquerda que nos cause o constrangimento que a Veja causa, todavia, nunca enxergo nos órgãos da esquerda uma postura francamente democrática, como a que existia nos anos oitenta entre os eurocomunistas. Em outras palavras, quando tudo indicava que iríamos ampliar nossos discursos social-democratas, nós, os da esquerda democrática, começamos a nos deixar levar no bolo de pessoas que falam bem de Chavez, e até nos calamos quando há certas críticas veladas a Obama para, então, descambar para a droga da frase “os Estados Unidos são imperialistas” e blá blá blá. Somos medrosos. Esquisito isso! Justamente após a perda de força do comunismo estalinista, nós acabamos nos deixando levar por discursos estalinistas. Justamente agora, que nós poderíamos analisar melhor, acabamos não analisando nada e reiterando discursos da esquerda carcomida.
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A mostra disso é o Fórum Social Mundial. Um monte de gente vai até lá para simplesmente vender livrinho doutrinário que quer provar que o Chávez tem o direito de ficar eternamente no poder, caso isso seja votado de forma plebiscitária! É claro que, neste caso, o que há é um mercado francamente capitalista de produção e circulação de literatura barata de um esquerdismo tolo. Mas a necessidade de “conquistar espaço” é tão grande, que às vezes encontramos ali intelectuais de certo renome brigando por um espacinho no cenário internacional, com medo de ter seus livros esquecidos. Isso é deprimente. Vemos então gente escrevendo coisas que nem mais acredita, mas que se mantém nisso por uma razão simples: seu público, ou o público que formou, ainda acredita naquilo! A esquerda não democrática faz muito isso! E não são poucos os escritores que agem assim. Vendem a alma para um demônio esquisito e conhecido, que são eles mesmos, ou melhor, eles mesmos no passado!
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Tenho tentado romper com isso há duas décadas ou mais. Tenho tentado sair dessa mediocridade tanto no âmbito da filosofia, nos seus aspectos mais técnicos, e também na imprensa, nos artigos mais populares. Não temos que temer de levantar erros nossos, ou da direita ou da esquerda. Não temos que fugir da condição de filósofos e deixar de analisar caso a caso. Pois, se perdemos isso, acabamos como filósofos. Caso não possamos fazer isso, a de analisar tudo doa a quem doer, não valemos mais nada como escritores.
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O grande erro dos discursos ideológicos extremistas não é o fato de tais discursos serem extremistas. A questão é outra: é que, em geral, o opositor é mostrado como o culpado de tudo do mesmo modo que Lúcifer acabou ficando perante Deus. Ora, quem é culpado de tudo, não é culpado de nada. Foi isso que escrevi para Olgária Matos, no artigo dela criticando “o capitalismo” no caso da Guerra em Gaza, na revista Carta Capital. Ela culpa o capitalismo por tudo. Faz um artigo sobre a greve na USP e diz que o capitalismo é o culpado. Há a guerra em Gaza e o capitalismo é o culpado. Esse tipo de discurso de esquerda acaba caindo no vazio, pois quem tem bom senso percebe que isso é uma fuga da filosofia, é a tentativa de não mais analisar as coisas. Eu fiquei feliz ao ver que ela deu razão para a minha crítica. Isso é sinal de que, no caso dela, as coisas ocorreram assim por escorregão, e não por determinação.
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Agora, essa atitude de encontrar sempre o mesmo sparring acontece com gente do tipo de Mainardi. Tudo para ele que vem do Lula é ruim, sem qualquer análise. Ou tudo que vem da esquerda não presta. Então, em determinado momento, ele já não tem mais leitores inteligentes. As pessoas que o estão escutando são surdas. São aquelas pessoas que não querem se informar ou analisar, elas querem apenas discursos doutrinários para confirmar o ódio que possuem por qualquer um que “olhe pelo social”. Também aqui, em uma situação assim, não temos morada para a filosofia.
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Não estou dizendo com isso que é virtude ser de centro. Lembram de Renato Janine apoiando veladamente o Lula na época do “mensalão”, dizendo que não tínhamos direito de julgar por meio de uma ótica moral o que é do âmbito público, da ética? Ora, aquilo de tentar ficar em cima do muro, para garantir emprego no governo, foi deprimente. Não, a posição centrista, sincera ou não, não tem virtude em si mesma. Aliás, quem achou que Aristóteles disse que a “virtude está no meio”, apontando o centro como uma boa posição, não entendeu nada. Não, ao contrário, um discurso centrista doutrinário é uma droga.
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Meu alerta é para aqueles jovens que começam a escrever, começam a estudar filosofia ou ciências humanas, e que não percebem que os bons filósofos e escritores são os que apertam feridas, mesmo quando as feridas vão doer neles mesmos. O bom filósofo e o bom escritor é antes de tudo um curioso sem excessiva prudência. O que mais o agrada é apontar para aquilo que todos olham e realmente enxergam, pois ele acredita que ainda há o que dizer do que está sendo dito. É o banal que é seu objeto. E o seu próprio rabo está depositado em cima do banal. Portanto, o filósofo-escritor é o contrário daquele macaco que senta na cauda e fala da cauda dos outros, ele é o que fala da cauda dos outros no que elas tem da sua cauda também. O filósofo tem uma completa falta de pudor, e nisso sua mão de escritor funciona bem. Ele é aquele para quem o demônio, o culpado de tudo, nunca existiu. O escritor de política, mesmo não sendo filósofo, poderia imitá-lo nisso.
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Paulo Ghiraldelli Jr.
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Filósofo.
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