RICHARD RORTY: Filósofo pragmatista estadunidense. Nasceu em Nova York em 1931 e faleceu em 2007.
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O texto a seguir é do Filósofo PAULO GHIRALDELLI JR. Dedico aos leitores do Blogue porque são pessoas que gostam de ler e se informar e não ficam com cara de bobo quando falam sobre esse e outros assuntos aqui abordados sobre vários pontos de vista.
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23/01/2009.
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No primeiro dia de governo, o Presidente Barack Obama mandou fechar a prisão de Guantanamo Bay, na ilha de Cuba. Sinto-me pessoalmente aliviado. Participei da maioria das campanhas contra a existência daquela prisão. Vislumbramos agora o fim do pesadelo.
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Um dia após o ataque de Bin Laden aos Estados Unidos, meu amigo Richard Rorty escreveu um artigo que ecoou o mundo rapidamente. Inclusive, este artigo foi publicado no mesmo dia aqui no Brasil, pela Folha de S. Paulo. Rorty estava solidário às vítimas. Mas, fazendo o papel que no passado coube a John Dewey, ele não deixou de ser o que um autêntico filósofo deve ser: a consciência crítica de sua nação. Assim agindo, escreveu dizendo que estava pedindo desculpas antecipadas pelo que o seu país faria dali para diante.
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Diferentemente de Habermas, que apoiou a invasão do Afeganistão, pois naquele caso a ONU endossou o trabalho conjunto de forças aliadas, Rorty não apoiou ou deixou de apoiar. Ele apenas constatou que seria mais uma guerra, e que os excessos seriam cometidos e, desta vez, por um governo que ele não via como legítimo. Todavia, na invasão do Iraque, Rorty discordou frontalmente, e a partir dali até sua morte recente, em 2007, ele se tornou rapidamente um crítico feroz contra a política de Bush.
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Até muito perto de seus últimos meses de vida, Rorty esteve pessimista quanto ao futuro da América. Todavia, nos últimos dias, ele começou a ver sinais de mudança. Na verdade, eu fui avisado da mudança antes mesmo que ele. Meu amigo Cody Carr, jovem filósofo e, hoje, advogado, esteve no início da década aqui no Brasil, e aqui publicou um artigo (revista Cult) dizendo: os jovens estão mudando, estão mudando por conta do Rock, do movimento dos artistas, e indicam o nome de um jovem senador para restaurar a democracia: Barack Obama. Recebi cartas e e-mails de gente me perguntando como que eu podia endossar um artigo de um jovem, então estudante de mestrado em filosofia, dizendo aquelas coisas. Não liguei para as objeções. Cody sabia o que estava dizendo. E eu, tendo trabalhado nos Estados Unidos, sabia que ele tinha lá sua razão.
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Depois de uns tempos, conversei com Rorty sobre isso. Ele insistiu comigo que ainda estava pessimista, que a América não estava dando mostras de poder recuperar sua melhor história. No prefácio que fez para um livro dele que traduzi, e que foi publicado aqui pela Martins Fontes, ele se manteve dizendo que a bandeira da democracia, que seu país havia levado adiante no século XX, poderia ser carregada por outros países. Ele chegou a apostar até mesmo no Brasil para tal serviço. Isso foi em 2005. No final de 2006 para 2007 ele começou a pensar diferente. Começou a ver que os jovens estavam se movimentando, e que a América ainda tinha força moral para reagir.
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E a América reagiu. Obama tomou posse e assinou o ato para colocar fim a uma barbárie que manchou o nome da maior e mais duradoura democracia do Planeta, a institucionalização da tortura e a criação de um verdadeiro campo de concentração – é isso que é Guantanamo Bay, nada mais. Ela, agora, será lacrada por ordem do Presidente dos Estados Unidos. E até o final do ano, deverá ser extinta. Inclusive, os julgamentos já pararam. E ontem mesmo, na CNN, alguns torturados, inclusive inocentes que estiveram naquele cativeiro, falaram abertamente sobre o que passaram lá. Um relato insuportável de se ouvir. Estes inocentes já estão em liberdade.
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O cumprimento de uma promessa de campanha um dia após a posse, que era fechar Guantanamo Bay mesmo sob pressão dos conservadores (não podemos esquecer que Barack Obama, com toda a sua popularidade, venceu uma disputa de modo apertado), renova nossas esperanças na democracia e na América. Esse tipo de coisa merece uma comemoração. Fechar Guantanamo Bay é uma vitória que merece mais que este artigo ou um vinho aberto. Merece que tenhamos em mente um elemento central da filosofia de Rorty: “antes esperança que conhecimento”.
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PAULO GHIRALDELLI JR.
23/01/2009.
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No primeiro dia de governo, o Presidente Barack Obama mandou fechar a prisão de Guantanamo Bay, na ilha de Cuba. Sinto-me pessoalmente aliviado. Participei da maioria das campanhas contra a existência daquela prisão. Vislumbramos agora o fim do pesadelo.
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Um dia após o ataque de Bin Laden aos Estados Unidos, meu amigo Richard Rorty escreveu um artigo que ecoou o mundo rapidamente. Inclusive, este artigo foi publicado no mesmo dia aqui no Brasil, pela Folha de S. Paulo. Rorty estava solidário às vítimas. Mas, fazendo o papel que no passado coube a John Dewey, ele não deixou de ser o que um autêntico filósofo deve ser: a consciência crítica de sua nação. Assim agindo, escreveu dizendo que estava pedindo desculpas antecipadas pelo que o seu país faria dali para diante.
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Diferentemente de Habermas, que apoiou a invasão do Afeganistão, pois naquele caso a ONU endossou o trabalho conjunto de forças aliadas, Rorty não apoiou ou deixou de apoiar. Ele apenas constatou que seria mais uma guerra, e que os excessos seriam cometidos e, desta vez, por um governo que ele não via como legítimo. Todavia, na invasão do Iraque, Rorty discordou frontalmente, e a partir dali até sua morte recente, em 2007, ele se tornou rapidamente um crítico feroz contra a política de Bush.
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Até muito perto de seus últimos meses de vida, Rorty esteve pessimista quanto ao futuro da América. Todavia, nos últimos dias, ele começou a ver sinais de mudança. Na verdade, eu fui avisado da mudança antes mesmo que ele. Meu amigo Cody Carr, jovem filósofo e, hoje, advogado, esteve no início da década aqui no Brasil, e aqui publicou um artigo (revista Cult) dizendo: os jovens estão mudando, estão mudando por conta do Rock, do movimento dos artistas, e indicam o nome de um jovem senador para restaurar a democracia: Barack Obama. Recebi cartas e e-mails de gente me perguntando como que eu podia endossar um artigo de um jovem, então estudante de mestrado em filosofia, dizendo aquelas coisas. Não liguei para as objeções. Cody sabia o que estava dizendo. E eu, tendo trabalhado nos Estados Unidos, sabia que ele tinha lá sua razão.
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Depois de uns tempos, conversei com Rorty sobre isso. Ele insistiu comigo que ainda estava pessimista, que a América não estava dando mostras de poder recuperar sua melhor história. No prefácio que fez para um livro dele que traduzi, e que foi publicado aqui pela Martins Fontes, ele se manteve dizendo que a bandeira da democracia, que seu país havia levado adiante no século XX, poderia ser carregada por outros países. Ele chegou a apostar até mesmo no Brasil para tal serviço. Isso foi em 2005. No final de 2006 para 2007 ele começou a pensar diferente. Começou a ver que os jovens estavam se movimentando, e que a América ainda tinha força moral para reagir.
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E a América reagiu. Obama tomou posse e assinou o ato para colocar fim a uma barbárie que manchou o nome da maior e mais duradoura democracia do Planeta, a institucionalização da tortura e a criação de um verdadeiro campo de concentração – é isso que é Guantanamo Bay, nada mais. Ela, agora, será lacrada por ordem do Presidente dos Estados Unidos. E até o final do ano, deverá ser extinta. Inclusive, os julgamentos já pararam. E ontem mesmo, na CNN, alguns torturados, inclusive inocentes que estiveram naquele cativeiro, falaram abertamente sobre o que passaram lá. Um relato insuportável de se ouvir. Estes inocentes já estão em liberdade.
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O cumprimento de uma promessa de campanha um dia após a posse, que era fechar Guantanamo Bay mesmo sob pressão dos conservadores (não podemos esquecer que Barack Obama, com toda a sua popularidade, venceu uma disputa de modo apertado), renova nossas esperanças na democracia e na América. Esse tipo de coisa merece uma comemoração. Fechar Guantanamo Bay é uma vitória que merece mais que este artigo ou um vinho aberto. Merece que tenhamos em mente um elemento central da filosofia de Rorty: “antes esperança que conhecimento”.
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PAULO GHIRALDELLI JR.
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Filósofo.
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