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sexta-feira, 26 de junho de 2009

QUEM CHORARÁ POR ELE?

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Charge do Filósofo PAULO GHIRALDELLI JR. O texto a seguir é também de sua autoria em vista da MORTE DE M.J.
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MICHAEL JACKSON, PARA ENGRAVIDAR.
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Diamante Negro não inventou o gol de bicicleta, mas o aperfeiçoou como ninguém. Pelé inaugurou dois movimentos fantásticos no esporte: a paradinha no ar para cabecear, a paradinha (permitida) para cobrar pênalti. E vocês se lembram do Bernardo, com o saque “viagem nas estrelas”? Pessoas assim, são gênios do movimento humano.
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Há também outro tipo de gênio do movimento humano, os que fazem do movimento aquilo que ele sempre foi, uma linguagem metafórica. O filósofo
Richard Rorty ensinou isso em seu livro Contingengy, irony, and solidarity (1980), de como que a metáfora não é “uma outra versão do literal”, e sim algo inusitado, como que um beijo ou um tapa ou um desenho em meio a uma narrativa. Rorty nunca me disse, mas eu poderia apostar que quando ele deu esse exemplo, para reinterpretar Donald Davidson e elaborar sua própria teoria da linguagem e da metáfora, ele estava pensando em um herói de sua época, Charles Chaplin.
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O engenheiro
Taylor estudou “tempos e movimentos” para racionalizar a produção. Chaplin mostrou na tela esse feito de Taylor, e imortalizou para nós uma noção popular de modernidade, em seu filme “Tempos Modernos”. Chaplin foi um estudioso, em um sentido tão genial quanto Taylor, mas de um modo diferente, das possibilidades do movimento humano. Ele uniu o tirocínio para o estudo do movimento humano com a própria capacidade de desempenho de uma série de novos movimentos ou, então, de reaproveitamento de velhos movimentos para novas significações.
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Na galeria da tradição dos gênios do movimento humano, Elvis Presley ganhou uma cadeira merecida. Madonna e Shakira vão ter as suas. Michael Jackson, falecido ontem, fixou para sempre seu lugar nessa galeria.
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Jackson não foi somente um grande cantor e excelente dançarino. Ele foi quem melhor gerou aquela arte que praticamente nasceu em seu tempo, a dos “clips” abusadamente coreográficos. A maneira como Jackson fez seu corpo ganhar o espaço a partir de novos gestos e novas significações de velhos gestos, integrando tal habilidade no contexto de “clips” que se transformaram em “mini-operas”, trouxe para o nosso mundo o que eu qualifico como “continuidade da história da democratização do movimento humano”.
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Pessoas como Jackson, fenômenos que aparecem somente de cem em cem anos, como muitos dizem, conseguem fazer com que a imaginação encontre o seu habitat. A imaginação quer que improvisemos. Ela quer experimentar novas sensações cinestésicas. Ela quer que nossas articulações ósseas e musculares testem outros caminhos, para que ela possa dar vazão aquilo que sabe fazer de melhor, que é a criação de expressões novas. No entanto, nossa jaula cultural é muito mais forte que a gravidade. Podemos voar, mas não podemos, muitas vezes, dançar. Talentos como Michael Jackson contam para nós outra coisa, um segredo de Polichinelo: devemos cantar e dançar, pois voar é fácil. Além disso, voar não diz nada. Cantar e dançar, dependendo de como nos libertamos para gesticular, diz tudo. E o “diz”, neste caso, é uma verbo que diz muito. Pois não poderíamos ser falantes se não tivéssemos corpo. Nosso cérebro não existiria se não pudesse, antes de tudo, estar ligado a braços e ao aparelho fonador. Aliás, duvido que ele fosse um cérebro, sem isso.
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Michael Jackson foi aquele tipo de pessoa que, como Chaplin, nos colocou em dúvida sobre se não devemos ampliar nosso conceito de linguagem, para além do que até hoje a filosofia o tomou. Jackson ensinou como que o espírito está grávido do corpo na medida em que nos mostrou um corpo altamente engravidado de espírito. Nesse sentido, ele fez filosofia. E talvez não tenha sido à toa que Sócrates foi um excelente dançarino, e gostava disso.
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Por: PAULO GHIRALDELLI JR.
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http://ghiraldelli.org e http://ghiraldelli.ning.com
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Para saber mais sobre filosofia do corpo: Ghiraldelli Jr. P.,
O corpo. São Paulo: Ática, 2008.
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