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segunda-feira, 27 de agosto de 2012

DUELO DE KLEPTES.



Brando estupefato com o golpe de mestre do motorista.


Mais uma história de Ana Flores, a cidade fictícia que criei para expressar as mais absurdas situações inventadas para apontar malfeitos políticos sem ter de dar nomes e identidades verdadeiros aos meliantes. Ana Flores tem sido nos últimos anos pródiga em situações inacreditáveis, uma vez que invento tais situações com o objetivo de escarnecer alguns políticos novos ricos.

Todos os personagens desta história e as situações por eles protagonizadas são meras criações fictícias e qualquer relação existencial com alguma cidade verdadeira ou personagens reais terá sido mera coincidência.

Desta vez a história é surpreendente.

Um político foi ao encontro marcado com um prestador de serviço para receber dele o “por fora” combinado desde que lhe foi garantido a execução de uma obra “elefante branco” através de uma concorrência fraudada. Depois de idas e vindas, por telefone e mensagens de texto via celular, o político já estava exasperado para receber a propina, pois tinha urgência em repassar o dinheiro a um emprestador não oficial de dinheiro que o pressionava ameaçadoramente já havia tempo.

Era pegar a propina e entregar nas mãos do emprestador não oficial de dinheiro. Tal pagamento era apenas uma parcela dos juros do dinheiro emprestado para uma campanha fracassada num passado recente. Seria jogo rápido. Assim tinha prometido o político a ele. Mas as coisas nem sempre saem do jeito que os salafrários desejam.

Tendo dado certo, finalmente, o encontro com o prestador de serviços e saído de lá com cerca de R$ 200.000,00 num envelope, o político foi embora com um sorriso cínico e desafiador das leis, dos cidadãos e das autoridades, nos lábios. O mesmo que ele costuma ostentar publicamente em eventos e nos meios de comunicação para os anaflorenses.

Ele se dirigiu ao carro que o esperava com o motorista já preparado para empreender fuga. O político disfarçou o envelope dentre outros papeis e o motorista, sua única companhia naquele momento, não percebeu a existência do envelope com a propina. Dada a ordem para sair dali, o motorista seguiu o itinerário indicado sem dizer palavra, pois o político não poderia se manifestar sobre o tema do encontro.

Mesmo que em alguns casos seja prudente aos ladrões confessar alguns poucos detalhes para que o acompanhante lhe sirva de testemunha em encontros como esses. Mas não foi este o caso. O político seguiu a viagem sem falar nada sobre o encontro e nem muito menos sobre o prestador de serviços. Poderia levantar óbvias suspeitas.

Chegando ao destino do político, o motorista foi dispensado para ir ao lugar que lhe aprouvesse. Descansar da viagem seria o mais sensato. Foi isto o que ele fez. Foi pra casa.

Ao chegar a casa o motorista foi vistoriar o carro. Um hábito comum entre os que exercem essa profissão. No banco de trás havia um envelope com certo volume aparente. Como o político não havia dito nada ao motorista sobre cuidados especiais quanto a qualquer objeto dentro do carro, já que tudo estava entre os papeis em suas mãos, o motorista foi averiguar o que havia dentro do envelope.

Pasmo ficou sem saber o que fazer diante de tanto dinheiro. A quantia era inimaginável para ele, mas apenas uma parcela de uma dívida do político com o emprestador não oficial de dinheiro. Ficou, por alguns segundos, a pensar sobre o que faria naquela situação. Qual a atitude mais recomendada? Qual a decisão mais prática a ser tomada em meio às milhares que lhe ocorriam diante de tanta propina?

Sem tempo para muito mais pensar, o seu telefone toca. Do outro lado um desesperado e angustiado político gritando para o motorista ir devolver-lhe um envelope que havia esquecido no banco traseiro do carro. Ao que o motorista lhe pergunta: “Que envelope, sr. Brando?

Não acreditando na pergunta Brando, o político, lhe indica o lugar para que procure imediatamente. Tudo bem, vou dar uma olhada. Assegura o motorista.

Passados alguns poucos minutos ele retorna. Não há envelope algum no banco traseiro do carro, não, Sr. Brando. O político fica mais louco ainda e diz: - Como não há se o deixei aí quando entrei no carro? Como pode ter desaparecido se só nós dois estivemos dentro do carro? Eu não peguei, então ou ele está lá ou você o pegou. Disse-lhe Brando. 

O motorista define a posição que irá adotar dali para frente com a intenção de garantir credulidade à sua versão dos fatos. Pelo menos à sua versão dos fatos. Negar a existência do envelope.

Firme nesta disposição de negar a existência do envelope – e não, não era um saco de lixo preto, mas um envelope desses de papel - o motorista permanece continente.

Brando, então, o chama para lhe falar pessoalmente. E quando o motorista chega o político o puxa pelo braço e o leva a uma sala reservada. – Vamos rapaz, devolva o envelope. Diz o político ao motorista. Ao que este lhe responde: - Não havia envelope lá, sr. Brando. Prove que havia envelope. O que havia dentro do envelope? Até agora o sr. só falou que existe um envelope, mas nada disse sobre o seu conteúdo.

- Não interessa o que havia dentro. O que quero é que você o devolva. Replicou Brando. Mas o motorista, astuto como um kleptes determinado a mudar de vida sem trabalhar e sem esforço algum se mantém impávido diante das ameaças feitas por Brando.

- Vamos definir bem a situação, disse o motorista a Brando. E continuou: - Se o sr. quiser me acusar de roubo vá à delegacia e faça uma queixa e me acuse de ter sumido com tal envelope. Mas não se esqueça também de declarar o conteúdo. Diga como tal envelope chegou às suas mãos, qual a origem e quem é o dono do conteúdo, a quem ele se destina.

Vendo que a situação se tornara mais embaraçosa do que previa, Brando se pôs a pensar por alguns segundos e percebeu que o motorista havia lhe dado um golpe. Um golpe de mestre. É claro que a intenção do motorista, inicialmente, não fora esta. Mas as circunstâncias lhe promoveram ao status de kleptes de ocasião com a grande oportunidade de mudar radicalmente a sua vida financeira.

Vendo que não iria convencer o motorista a devolver os R$ 200.000,00 o político resolveu demiti-lo e mandá-lo embora. É claro que ambos não iriam comentar com mais pessoas o golpe de mestre. Até porque ambos correm o risco de ser presos se declararem o conteúdo do envelope e de sua origem, como também de sua destinação. Mas há sempre momentos de indiscrições de uma parte e de outra. 

O motorista foi cuidar de sua nova vida financeira em outra cidade. De lá manda lembranças a Brando toda vez que encontra um conhecido. Não envia lembranças para debochar da situação, não. Mas grato pela reviravolta financeira que dera em sua vida graças às trapalhadas de um político ladrão.

P. S.: Esta foi mais uma obra de ficção de minha autoria. Se o leitor quiser saber a origem da palavra ladrão e seu significado original basta clicar AQUI. Até breve com mais histórias de Ana Flores.  


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