Foto da Internet do corredor polonês
feito por médicos brasileiros na chegada dos colegas estrangeiros.
Adolpho Lutz, Carlos Chagas, César Lattes, Oswaldo Cruz,
Euryclides Zerbini, Angelita Habr-Gama, Miguel Nicolelis.
Os nomes da medicina brasileira acima deixam qualquer um de
nós orgulhoso do trabalho científico que nos legaram.
Adib Jatene, Ivo Pitanguy, Roberto Kalil Filho, David Uip,
Dráuzio Varela.
Já os que acabei de citar são exemplos de médicos que se
dedicam ao exercício da profissão com alto grau de excelência. Sabemos disso.
Em Floriano temos vários médicos que se dedicam ao exercício
da profissão de forma inteligente, capaz, estruturada e, em certo grau, bem instrumentalizada.
E eles são referência de excelentes profissionais tanto na capital quanto na
nossa região.
O que vejo neles todos que me levam à admiração é o fato de
que fazem aquilo que gostam de fazer. E não o fazem apenas pelo status e pela
renda que obtêm, mas porque é algo que os tornam felizes pela autorrealização.
Sendo assim, praticam a medicina não pela metade, mas de
corpo inteiro. Quem gosta do que faz se entrega completamente. Seja qual for a
profissão.
A consequência desse ato é o reconhecimento e a valorização
que obtêm da sociedade.
Quem não gosta do que faz não é reconhecido e nem muito menos
valorizado. O faz apenas pelo status e pelo salário. Mas nunca estará numa
lista como essa que citei acima. Que não é minha, mas elaborada por academias e
pelos próprios pares.
Estou falando tudo isso em virtude da guerra que alguns
médicos estão travando contra o projeto do governo federal de importar médicos
para trabalhar estritamente nos locais onde esses médicos que estão reclamando não
querem e não aceitam trabalhar. Seja qual for a justificativa.
Eles têm todo o direito de não querer ir trabalhar nesses
lugares miseráveis sem estrutura e sem instrumentos. E também, a meu ver, não
podem ser obrigados a ir. É uma questão de escolha.
Mas o que justifica a agressão moral contra os médicos
estrangeiros que aceitaram o convite do governo brasileiro para trabalhar
especificamente nesses locais?
Não há racionalidade no ato de agressão efetuado inclusive
com a formação de um corredor polonês em Fortaleza com xingamentos e expressões
racistas a colegas de profissão de outra nacionalidade.
As condições que muitos profissionais médicos exercem a
medicina em instituições públicas são lamentáveis. O Brasil todo sabe disso e
reclama por melhorias dessas condições e construção de novas unidades para que
o atendimento tenha o mínimo de dignidade.
Médicos que trabalham nessas condições reclamam com muita
frequência e firmeza da falta até dos instrumentos básicos.
Já os doentes carentes em sua situação de urgência ou emergência
não têm paciência para avaliar as circunstâncias e põem a culpa nos médicos
pela falta de atendimento nos moldes que deve ser.
Pronto, está aí a situação explosiva que faz desencadear os
desentendimentos frequentes entre as partes nas instituições públicas.
As políticas públicas que venham elevar o nível de qualidade
nos atendimentos nessas instituições estão sendo providenciadas, o governo
federal já as anunciou. Aqui em Floriano será construído um novo hospital, por
exemplo. Mas essas políticas demoram a ser implementadas.
As providências que devem ser tomadas para que as condições
de trabalho e atendimento sejam melhoradas ainda devem demorar, já que o
sucateamento da saúde pública, a meu ver, é uma realidade de décadas.
Não vou levar adiante os motivos ideológicos do desmonte das
instituições, pois chegaríamos a uma conclusão que gera discordância, mas que é
difícil de ser negada.
Na ausência de serviços públicos de qualidade abre-se um
grande mercado para as instituições privadas. E se a saúde pública fosse
gratuita e de alta qualidade para todos aniquilaria as pretensões de qualquer
investimento privado.
Acredito que não seja apenas incompetência dos seguidos
governos federais ao longo de décadas aliado ao desinteresse político pelas
necessidades desse público desarticulado.
Dito isso tudo, resta perguntar: se alguns médicos não querem
e não aceitam trabalhar nos locais miseráveis e com as condições citadas o que
se deve fazer com os doentes pobres e necessitados de atendimento emergencial?
Há uma grande discussão sobre a importação de trabalhadores
altamente qualificados para trabalharem no Brasil. Mas é certo que muitas
empresas contratam especialistas para procurarem profissionais em vários países
do mundo onde são reconhecidos na formação dos profissionais desejados.
Alguns estudiosos dizem que há uma demanda de cerca de 6
milhões de profissionais de outras nacionalidades. Mas essa informação é também
objeto de discussão. Leia AQUI.
Engenheiros de várias especialidades, arquitetos,
profissionais da área de TI e mais outros são aguardados por aqui. As empresas
privadas reclamam da demora na liberação do visto de trabalho para esses
profissionais.
Não se conhece nenhuma manifestação agressiva e
preconceituosa contra esses outros profissionais quando chegam ao Brasil. Não
se sabe de reclamações de conselhos profissionais contra esses trabalhadores.
A guerra travada por alguns médicos tem também caráter
ideológico, pois se o governo resolvesse importar outros tipos de
profissionais, como os citados acima, teríamos também corredores poloneses para
a chegada deles?
Acredito que sim. Mas como os importadores dos trabalhadores
qualificados citados acima são as empresas privadas, então esse tipo de
protesto perde o sentido ideológico. Não se sustenta e não se efetiva.
Eu defendo os direitos de minha classe profissional. Eu luto
pela melhoria das condições de trabalho. Mas sou contra aqueles que não
realizam seu trabalho da forma como a sociedade necessita e espera.
Espírito de corpo só é aceitável quando a defesa tem à frente uma causa nobre.
Não defendo profissional sem compromisso com sua atividade
profissional, sem respeito pelos outros. Não estou ao lado de quem não trabalha
e mesmo assim quer receber salário igual a quem se entrega completamente à
profissão.
Acredito que todos nós queremos que a saúde pública do Brasil
tenha seus problemas solucionados para que as pessoas que dela necessitam possam
ter dignidade no atendimento e na cura de suas urgências e emergências.
Mas quantos de nós estamos dispostos a abrir mão de certos
privilégios e interesses para olhar para quem é o principal motivo dessa guerra
toda, o atendimento aos pobres?
Certamente os médicos citados no começo do texto não cultivavam
ou cultivam espírito de corpo em defesa de quem só pensa em status e salário.