Foto
do Facebook do russo Alexander Remnev (esq) durante uma viagem a Dubai, no
primeiro semestre de 2014. A imagem acima foi tirada em uma torre que, segundo
Remnev, tem 345 metros de altura.
Em texto publicado na
Folha de São Paulo em 23.07.2015. o psicanalista italiano Contardo Calligaris
fala de um comportamento que tem se evidenciado cada vez mais nas redes sociais
e que ele chama de “"selfies perigosos": autorretratos em situações
que implicam o risco de perder a vida.”
O que se pretende mostrar
com essas incessantes e intermináveis demonstrações de aparente insanidade é
dizer para os “amigos” (que curtem as fotos postadas) que “eu estou vivendo
mais do que você” e que a sua vida é “insossa, insignificante”. Portanto estou
aproveitando muito mais a vida e tornando-a, pelo menos para mim e para as
coisas em que acredito e que por elas sou capaz até de por a minha vida em
risco, mais interessante e merecida.
Enquanto você fica aí
sentado no sofá feito um boboca desperdiçando o tempo de forma mesquinha e
irrelevante eu estou aqui vivendo, mesmo que muitas de minhas fotos não mostrem
situações de risco ou perigo. Mas elas mostram experiências que arrancam de
dentro de mim a sensação de realização a ponto de eu sentir a necessidade de
mostrar para você que eu estou feliz e completo do que você que está aí só
olhando, curtindo e morrendo de inveja de mim e de minhas experiências.
Pensando assim como
sugeriu Contardo Calligaris, isso não é uma coisa nova entre nós humanos, porém
estamos vivendo um momento histórico em que o marasmo, o tédio a mesmice tem
levado as pessoas a irem muito mais além do que normalmente se pensaria em ir
para romper com o marasmo, o tédio e a mesmice. Daí vem as fotos do alto de
prédios em situação de risco, os chamados "selfies perigosos”, para
mostrar o que sou capaz de fazer para ir além do “normal”, para mostrar que não
poupo energia para fazer a minha vida ser algo que valha a pena e, além disso,
poder te fazer inveja cor tudo isso.
Não há nada de novo nesse
comportamento humano de desejar fazer o outro se sentir menor do que nós. Mas a
Internet tem feito isso de forma avassaladoramente imediata. No momento mesmo
que o sujeito está experienciando sensações que ele garante serem capazes de
superar o marasmo, o tédio e a mesmice, ele posta na expectativa que vejam e
curtam, ou seja, que digam que estão todos assistindo a ele viver enquanto que quem
curte apenas está olhando sentado espalhado num sofá ou numa cadeira na antessala
de um consultório assombrados pelo marasmo, pelo tédio e pela mesmice.
Nesse meio eu me vejo como
alguém que dificilmente posta fotos das experiências que tenho ou dos fatos que
protagonizo. Isso me torna, nessa perspectiva, uma pessoa assombrada pelo marasmo,
pelo tédio e pela mesmice. Será verdade? O fato de eu não postar fotos minhas
significa que não tenho tido experiências ou, pelo contrário, para mim isso
significa que não é relevante que os outros saibam de tudo o que faço e quando
faço? Sou uma pessoa com atitudes diferentes e dou às redes sociais uma
destinação que não seria própria dela, posto que ela serviria mesmo para a
finalidade da exposição de egos? Não sei ao certo.
Só sei que alguns fazem
questão de registrar em selfies suas experiências de tal modo que terminam
mostrando uma pessoa, um mundo, uma realidade que não se sustentam na
concreticidade. Contardo Calligaris cita
no seu texto que um amigo seu com que ele viajou muito, e que era gay numa
época que ser gay era muito pior do que hoje, se aproximava de mulheres lindas para
que Contardo tirasse fotos dele ao lado delas para quando retornassem à empresa
poder mostrar aos amigos que tinha ficado com tais e tais mulheres. É sobre
isso que falo.
Prefiro evitar mostrar
minhas experiências para não assombrar meu marasmo, meu tédio, minha mesmice.
P.S.: Para ler o texto de Contardo Calligaris clique AQUI.
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