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quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

QUAL A LINHA DE PESQUISA DO SEU DOUTORADO?

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Em agosto de 2008 fiz uma postagem aqui no Blogue ("POR FAVOR: DR. JAIR.") sobre um tema bastante controverso. Trata-se do desejo de alguns (que é quase sempre frustrado pelos que conhecem um pouco de leis e de direitos) de serem tratados por “Doutor” através de exigência ostensiva.
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Recebi um emeio dando conta de uma sentença judicial contra a pretensão de um Juiz de Direito que queria que o porteiro do prédio em que ele mora o tratasse por “Doutor”.
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Não considero correto (nem mesmo legal) que alguém queira impor uma forma de tratamento para que seja reverenciado e, no caso aqui o tratamento é Doutor, os outros tenham o dever de tratá-lo, como desejado, se não possuir um título de Doutorado em Instituição de Ensino Superior.
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Em novembro de 2004 já havia escrito um texto a partir do qual fiz um resumo que você pode ler clicando acima. Esse texto de 2004 possui dez páginas e vários estudantes de Direito da UESPI-Floriano o leram na época que escrevi. A maioria discordou. Mas, vá lá, nunca desejei a unanimidade.
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O texto de 2004 chama-se: “Por favor! Dr. Jair” que você pode acessá-lo clicando AQUI. Foi uma resposta humorada que dei às recorrentes perguntas de alunos sobre essa mania de alguns se auto-intitularem “Doutor”. Não tem, portanto, nível de cientificidade. Para isto pode-se encontrar textos em outras fontes.
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Leia a seguir a sentença do Juiz.
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"PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
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COMARCA DE NITERÓI – NONA VARA CÍVEL
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Processo n° 2005.002.003424-4
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SENTENÇA
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Cuidam-se os autos de ação de obrigação de fazer manejada por ANTONIO MARREIROS DA SILVA MELO NETO contra o CONDOMÍNIO DO EDIFÍCIO LUÍZA VILLAGE e JEANETTE GRANATO, alegando o autor fatos precedentes ocorridos no interior do prédio que o levaram a pedir que fosse tratado formalmente de ''senhor''.
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Disse o requerente que sofreu danos, e que esperava a procedência do pedido inicial para dar a ele autor e suas visitas o tratamento de ''Doutor'', ''senhor'', ''Doutora'', ''senhora'', sob pena de multa diária a ser fixada judicialmente, bem como requereu a condenação dos réus em dano moral não inferior a 100 salários mínimos.
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DECIDO. ‘O problema do fundamento de um direito apresenta-se diferentemente conforme se trate de buscar o fundamento de um direito que se tem ou de um direito que se gostaria de ter''(Noberto Bobbio, in A Era dos Direitos, Editora Campus, pg. 15).
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Trata-se o autor de Juiz digno, merecendo todo o respeito deste sentenciante e de todas as demais pessoas da sociedade, não se justificando tamanha publicidade que tomou este processo. Agiu o requerente como jurisdicionado, na crença de seu direito. Plausível sua conduta, na medida em que atribuiu ao Estado a solução do conflito. Não deseja o ilustre Juiz tola bajulice, nem esta ação pode ter conotação de incompreensível futilidade. O cerne do inconformismo é de cunho eminentemente subjetivo, e ninguém, a não ser o próprio autor, sente tal dor, e este sentenciante bem compreende o que tanto incomoda o probo Requerente.
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Está claro que não quer, nem nunca quis o autor, impor medo de autoridade, ou que lhe dediquem cumprimento laudatório, posto que é homem de notada grandeza e virtude. Entretanto, entendo que não lhe assiste razão jurídica na pretensão deduzida.
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''Doutor'' não é forma de tratamento, e sim título acadêmico utilizado apenas quando se apresenta tese a uma banca e esta a julga merecedora de um doutoramento. Emprega-se apenas às pessoas que tenham tal grau, e mesmo assim no meio universitário.
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Constitui-se mera tradição referir-se a outras pessoas de ''doutor'', sem o ser, e fora do meio acadêmico. Daí a expressão doutor honoris causa - para a honra -, que se trata de título conferido por uma universidade à guisa de homenagem a determinada pessoa, sem submetê-la a exame. Por outro lado, vale lembrar que ''professor'' e ''mestre'' são títulos exclusivos dos que se dedicam ao magistério, após concluído o curso de mestrado.
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Embora a expressão ''senhor'' confira a desejada formalidade às comunicações - não é pronome -, e possa até o autor aspirar distanciamento em relação a qualquer pessoa, afastando intimidades, não existe regra legal que imponha obrigação ao empregado do condomínio a ele assim se referir. O empregado que se refere ao autor por ''você'', pode estar sendo cortês, posto que ''você'' não é pronome depreciativo. Isso é formalidade, decorrente do estilo de fala, sem quebra de hierarquia ou incidência de insubordinação. Fala-se segundo sua classe social. O brasileiro tem tendência na variedade coloquial relaxada, em especial a classe ''semi-culta'', que sequer se importa com isso.
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Na verdade ''você'' é variante - contração da alocução – do tratamento respeitoso ''Vossa Mercê''.
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A professora de lingüística Eliana Pitombo Teixeira ensina que os textos literários que apresentam altas freqüências do pronome ''você'', devem ser classificados como formais. Em qualquer lugar desse país, é usual as pessoas serem chamadas de ''seu'' ou ‘dona'', e isso é tratamento formal.
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Em recente pesquisa universitária, constatou-se que o simples uso do nome da pessoa substitui o senhor/a senhora e você quando usados como prenome, isso porque soa como pejorativo tratamento diferente.
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Na edição promovida por Jorge Amado (Crônica de Viver Baiano Seiscentista), nos poemas de Gregório de Matos, destacou o escritor que Miércio Táti anotara que ''você'' é tratamento cerimonioso (Rio de Janeiro/São Paulo, Record, 1999).
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Urge ressaltar que tratamento cerimonioso é reservado a círculos fechados da diplomacia, clero, governo, judiciário e meio acadêmico, como já se disse. A própria Presidência da República fez publicar Manual de Redação instituindo o protocolo interno entre os demais Poderes. Mas na relação social não há ritual litúrgico a ser obedecido. Por isso que se diz que a alternância de ''você'' e ''senhor'' traduz-se numa questão sociolingüística, de difícil equação num país como o Brasil de várias influências regionais.
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Ao Judiciário não compete decidir sobre a relação de educação, etiqueta, cortesia ou coisas do gênero, a ser estabelecida entre o empregado do condomínio e o condômino, posto que isso é tema interna corpore daquela própria comunidade.
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Isto posto, por estar convicto de que inexiste direito a ser agasalhado, mesmo que lamentando o incômodo pessoal experimentado pelo ilustre autor, julgo improcedente o pedido inicial, condenando o postulante no pagamento de custas e honorários de 10% sobre o valor da causa.
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P.R.I.
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Niterói, 2 de maio de 2005.
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ALEXANDRE EDUARDO SCISINIO
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Juiz de Direito"
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4 comentários:

Tenho nível superior. sou Dr. também disse...

Teve um caso q aconteceu comigoq fiquei pensando neste tema, em 2005 trabalhei num lugar q tinha um recém formado na área de saúde e nós (funcionários) o tratávamos pelo nome e não pelo título q elenem tinha o famoso e banalizado "Doutor",ele não se importava, mas a namorada dele ficava pressionando ele pra "impor respeito" e dizer pros funcionários (nós) tratá-lo pelo título de Doutor. isso vem do costume antigo quando ter um título de nível superior era coisa de pouquissimos os filhos de coronel por exemplo,hoje q está mais democratizado o ensino superior isso deve ser revisto.

Aristócrates Carvalho disse...

A sentença de Alexandre Eduardo Scisinio comprova que ainda existem magistrados comprometidos em fazer Justiça com letra maiúscula, mesmo que tenha de decidir em desfavor de um colega magistrado. O magistrado deu um tiro mortal no fantasma do corporativismo que costuma assombrar muitas decisões do Judiciário nacional.

JAIR FEITOSA disse...

Olá Aristócrates.

Tem muita gente prepotente nesse meio. Todos sabemos disso. Minha primeira filha está cursando Direito (quer ser Juíza), mas procuro ensinar que não é sendo arrogante e prepotente que se consegue respeito.

Reconhecimento e respeito obtém-se com competência, lisura, honra e conhecimento. Fora disso o máximo que se consegue é o medo de alguns poucos desinformados de seus direitos.

Um abraço e obrigado por comentar.

Jair Feitosa.

JAIR FEITOSA disse...

Olá "Dr. também".

É a ideologia da humildade. Alguns espertalhões utilizam desse artifício para submeter outros desinformados na posição de submissão. O "falso" título é utilizado para impor uma superioridade que, em princípio, não existe. E se existe em vista de uma hierarquia, deveria ser exercida com dignidade e não através de um arífício enganoso.

Obrigado por comentar.

Jair Feitosa.