Quando soldados turcos
derrubaram ontem um avião da Rússia que teria invadido o espaço aéreo da
Turquia, um dos dois pilotos russos foi morto ainda no ar quando pairava em seu
paraquedas por “soldados” da milícia turcomana Alwiya al-Ashar que lutam para
derrubar o presidente da Síria, Bashar al-Assad. Essa milícia é uma espécie de
Estado Islâmico quando se trata de direitos humanos e de morrer pela religião. Ou
seja, são uns bárbaros.
No vídeo, “soldados” da milícia
Alwiya al-Ashar apontam metralhadoras capazes de derrubar aviões na direção dos
dois pilotos russos que se ejetaram do avião abatido pelas forças turcas. Nesse
momento eles pairavam sobre uma região da Síria que está sob domínio dos
milicianos. Um dos pilotos russos é assassinado ainda no ar. O vídeo termina
com o corpo do piloto russo morto no chão e os milicianos gritando Allahu Akbar
que significa “Deus é grande”. O outro piloto que também pairava em seu paraquedas
conseguiu se safar e foi resgatado mais tarde pelo Exército sírio comandado por
Bashar al-Assad.
O que me interessa aqui é
a questão ética envolta no ato bárbaro de matar alguém, mesmo numa guerra, sem
condições de se defender. Isto é crime
de guerra e seus autores terão de ser punidos severamente. Nas convenções de
Haia e Genebra que trataram sobre crimes e as condutas numa guerra,
normatizaram os procedimentos e deram um aval minimamente ético numa situação
que passa a existir quando parte significativa da ética já não existe mais: a
guerra.
A banalização do mal, de
fala Hannah Arendt, ocupa outro espaço na mente daqueles que praticam tais
atos, a meu ver. Pois quando o mal se banaliza a ponto de levar aqueles que
cumprem ordens a praticarem atos bárbaros, como os soldados de Hitler, a
convicção reside na compreensão de que estão cumprindo ordens, e não pensam,
não discutem, não refletem sobre o que fazem, e não podem deixar de fazê-lo
porque têm a responsabilidade de fazer a burocracia funcionar mesmo que ela seja
uma máquina de matar inimigos. O que lhes foi ordenado será feito porque visam
o cumprimento do dever e a aspiração às promoções e crescimento corporativo. Ou
seja, não se sentem como praticantes do mal.
Já os fundamentalistas
escondem as suas razões no lado mais escuro da mente porque pensam, refletem e
discutem sobre a melhor maneira de fazer o que fazem. Não é que sejam burros, é
que são conscientemente pré-determinados a fazer aquilo que têm de fazer
metodicamente. Ou seja, eles sabem o mal que fazem e desejam fazê-lo cada vez
mais sem banalizá-lo. E a recompensa é o paraíso supranatural. A promoção a que
almejam não é dada por seu líder religioso, seu Califa. Mas por Deus. Assim creem.
Quando o sujeito está num
meio em que as regras o levam a agir violentamente, deveria agir mediado por
sua moral que o poria conscientemente como capaz de decidir refletidamente
sobre a melhor maneira de agir. É a saída apontada por alguns pensadores
atuais.
“Não matamos vítimas
indefesas... e jamais deixamos um companheiro desprotegido! Jamais! Mesmo em
guerra, ainda somos homens... não animais!”, disseram Robert Kanigher e Joe
Kubert.
Os “soldados” da milícia fundamentalista islâmica síria já nos deixaram
no campo solitário dos homens e foram para o campo dos animais. O nosso campo
está cada dia mais se tornando menos povoado e menos sensível com a nossa
condição de humanos. Eles são animais que querem ser deuses sem passar pelo
caminho da humanização.